Um pouco do que a ciência diz sobre o afeto

O psicólogo Jean Piaget defende a equivalência entre as construções afetivas e cognitivas dos indivíduos, estando interligadas as reações, a obediência e os sentimentos de carinho e ternura. A afetividade e inteligência são de naturezas distintas, mas são ambas fundamentais para que ocorram as interações entre sujeitos e objetos. Para o autor, o afeto não é apenas emoção e sentimento, mas engloba as tendências e vontades infantis, o que também vai influenciar nas noções de interesse no “eu” e os pensamentos relativos aos outros. Dentro dos esquemas afetivos, estão as construções dos sentimentos iniciais das crianças, ligados às satisfações de suas necessidades.

Até os 2 anos, as emoções são geradas a partir do contato com a mãe, centradas no corpo do indivíduo. Na medida em que o corpo se separa dos outros, a vida afetiva do bebê vai se descentralizando. Dessa forma, o sentimento construído entre mãe e filho se generaliza, espalhando-se ao pai, irmão e companheiros, acomodando-se às situações. Dos 2 aos 12 anos, as crianças passam por modificações na conformidade entre o afeto e a cognição, valores, sentimentos pessoas e em relação às pessoas que o rodeiam. O processo afetivo é contínuo e inovador, ligado à evolução da sociedade, ou seja, construído gradativamente.

Já foi possível perceber, dentro do exposto por Jean Piaget, que a intensidade do carinho influenciará em aspectos além do que achávamos: a resistência às frustrações, a capacidade de compreender complexidades, amar, respeitar e se adaptar ao mundo e às mudanças são bastante determinadas pela base que a criança possui.

Esse tema é fundamental para o processo de aprendizagem e sua construção desafia os educadores, pois apresenta caminhos decisivos para a qualidade em sala de aula. Você, pai, deve lembrar de algum professor que marcou seus anos, misturando-o aos sentimentos afetivos que definiram a vida escolar. Nem sempre é fácil debater este assunto, pois transforma o afeto em um termo consciente e intencional do cotidiano em sala de aula.

As dificuldades no importante caminho da pedagogia afetiva

Durante a modernidade, a discussão sobre a afetividade no ambiente escolar ganha nova relevância. A ausência parental, o aumento do uso da tecnologia ou a insegurança nos ambientes externos que por vezes impossibilitam a saída para brincar e interagir resultam em carência afetiva crescente, desmotivação, dificuldade em manter atenção, indisciplina e outros desafios para a convivência saudável. A importância do afeto anda junto, nesse sentido, com o enfrentamento da realidade de escolas públicas e particulares, sendo estas uma possibilidade ou as vezes a única forma otimizada de troca interpessoal para alguns alunos.

Abordagens afetivas, que veem o aluno integralmente, podem não soar naturais, principalmente depois da educação infantil e dos primeiros anos do ensino fundamental. A causa disso é, entre outros motivos, histórica, pois a educação ocidental define o conhecimento como técnico e racional, limitando o “ser professor” a transmitir conteúdos, sem perceber que o resultado positivo da transmissão de conhecimento depende da interação professor-aluno.

Estes problemas, por outro lado, foram acompanhados de mais abertura na modernidade para a legitimação de uma visão menos arcaica do aspecto razões-emoções, permitindo essa mudança dentro do espaço escolar.

As práticas afetivas durante o trajeto escolar

O afeto é parte inerente da interação humana, dentro ou fora da sala de aula. O grande desafio é, entretanto, trazê-lo para ações conscientes. Para isso, é importante entender que essa prática afetiva não é necessariamente dar carinho. Mas também ter atenção a quem o aluno é, ao que o afeta, de forma a auxiliar o aprendizado. Na prática, isso significa literalmente prestar atenção na intenção por trás de cada atitude, percebendo se as práticas estão auxiliando na construção do caminho educativo, variando em cada etapa. Essa relação é permeada através de um contrato afetivo, de forma que o docente ainda é figura de autoridade e referência.

Construir uma relação pautada na visão integral de quem é o aluno, entendendo seus aspectos emocionais, motores, culturais e sociais é a forma mais abrangente de aprendizado, podendo ser conectada ao que já entendíamos nas Inteligências Múltiplas: prezando pelo aluno como ser individual, que precisa escolher caminhos, estimular suas habilidades únicas e trocar conhecimentos para desenvolver autonomia.

O ambiente escolar é visivelmente afetado por essa interação, pois não é apenas o aluno quem tende a ser beneficiado com a abordagem afetiva. A humanização da relação leva o professor a ampliar a capacidade educativa. Nós, professores, nos sentimos frustrados quando não tocamos o aluno mais profundamente como era o planejado, não conseguindo passar com completude a reflexão que pretendíamos. A sensibilidade auxilia esse trajeto, indicando as direções para as quais o aprendizado pode avançar.

Para estabelecer ainda mais essa prática afetiva, a Escola Meu Caminhar compreende que a postura não se situa apenas nos professores, mas também é responsabilidade dos nossos gestores. Dessa forma, é importante estabelecer boas condições aos professores, para que sua atuação tenha plenitude, inclusive do ponto de vista afetivo, criando uma cultura capaz de auxiliar nos desafios diários.

Assim, notamos características que vão desde a estrutura – salas com quantidade ideal de alunos, de forma que o professor possa tratá-los individualmente, com paredes que não se sujeitem a ruídos, para que o que o docente fale em uma tonalidade que o favoreça, entre outras particularidades –, entendendo os nuances de cada etapa educativa.

Na educação infantil, o contato na relação é socialmente mais valorizado, embora seja desafiante não se acostumar ao cuidado inconsciente, mas sim construí-lo tendo em mente que, nessa fase, toda atividade é importante para o desenvolvimento infantil. Até trocar uma fralda pode ter mais qualidade quando o educador estimula o bebê com a sua voz, depositando intencionalidade na atuação.

Entendemos que cada momento da vida escolar tem seus questionamentos e dificuldades. Durante o Fundamental I, os olhares que separam a cognição dos afetos crescem, ganhando ainda mais força no Fundamental II. Culminando no Ensino Médio, quando a visão construída tecnicamente sobre o mercado de trabalho e as complexidades da adolescência diminuem ainda mais o ponto de vista afetivo.

Como forma de reverter essa situação, durante o ensino médio, o professor pode criar conteúdos ligados ao projeto de vida dos jovens, entrando mais profundamente em sua individualidade e auxiliando-o em sua visão de futuro. Sessões na biblioteca, debates e conversas são ótimos ambientes para acompanhar de forma mais próxima a criança. Livros, imaginação e letras criam um ambiente que favorece a alegria e o aprendizado.

Claro, é preciso ter sempre em mente que o simples uso da afetividade não significa sucesso é escolar. Tudo depende do contexto do aluno e da escola. Simples cuidados com o caderno ou demonstração de maior interação com o professor podem significar muito em um ambiente delicado em que o aluno não apresentava resultados anteriormente positivos.

A prática do afeto dentro do lar

A prática do afeto dentro do lar é complexa e abrangente. Ela é imprescindível para o crescimento da criança, independentemente de sua aplicação na escola – o ambiente escolar, embora de inegável vital importância, jamais poderá substituir a carência afetiva parental.

Durante o cotidiano, não é necessário pensarmos em uma atitude extravagante: alguns minutos a mais de brincadeira e risadas no banho, um colo e carinho oferecido em um momento de medo, escutar os temores e emoções dos nossos filhos, o olho no olho na hora de elogiar ou gestos bem-humorados durante as brincadeiras compartilhadas.

Desligar os celulares durante o jantar, dedicando aquele momento ao diálogo familiar, é um ambiente que pode criar ótimas memórias permanentes e determinantes. Conversas calmas antes de dormir, em um momento individual de qualidade com o seu filho, é importante inclusive para o seu desenvolvimento cognitivo. Durante o crescimento do filhote, os questionamentos sobre a proximidade se tornam mais abrangentes, então é fundamental que o caminho de intimidade seja construído desde a infância.

Com gestos cotidianos, pais e educadores colocam em prática um consenso importante reconhecido pela neurociência: o afeto oferecido à criança nos seus primeiros anos de vida moldará sua personalidade e servirá contra doenças como a ansiedade e a depressão. A negligência emocional deixa marcas que podem contribuir para o surgimento de distúrbios afetivos.

É claro que vários fatores contribuem para o desenvolvimento cerebral, sendo a genética um deles, e por isso a associação entre os genes e o ambiente em que as crianças vivem dará o resultado. Portanto, cabe aos adultos, pais e educadores, assegurar que o cenário seja pleno em afeto e segurança.

 

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